Foram anos de poemas declamados no colégio de freiras e de outros tantos a retalhar versos como se fossem só uma aglomeração de a-b-b-a e sinédoques – que identificamos com o mesmo entusiasmo de quem decora a lengalenga do teorema de Pitágoras. Até que um dia, depois todo este ruído, conheci o mestre Caeiro, e todas as vigas e alicerces que me sustêm se manifestaram. Nunca texto nenhum me tinha acordado daquela forma.

Foi nessa altura que entendi toda a reverência (muitas vezes bafienta) com que se tratava a Poesia. E percebi que a Poesia a sério não era uma colecção de formalismos alinhavados com uma linguagem pomposa, como o sistema de ensino nos quis fazer acreditar.

Assim que ouvi o rotineiro “vamos analisar o poema”, a minha vontade foi sair porta fora para ficar a sós com aquelas palavras que estava a sentir tanto – talvez um pouco como quem se refugia no templo do seu credo, para se religar ao seu sentido do divino. Ainda protestei mas tive mesmo de tolerar a autópsia e inspecção de órgãos daquele corpo que estava tão vivo.

O grande segredo é que, depois de se sentir um poema desta forma, nunca mais nos apanham em balelas de análises mecânicas. Sim, senhor, tiramos os apontamentos e marcamos os quiasmos que quiserem – mas o que eles nos dizem, isso passamos a trazer connosco.

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