Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
E sem desassossegos grandes.
Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento de mais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre iria ter ao mar.
(…)
Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-ás de mim depois
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova
(…)
Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio, Ricardo Reis
Andava há meses para escrever este post mas circunstâncias recentes dão-lhe mais sentido agora…
Desde a primeira leitura que este poema se tornou no meu ódio de estimação. Monopolizei uma aula de Português e páginas da folha de ponto do Exame Nacional a criticá-lo. Não do ponto de vista poético, entenda-se, mas pela filosofia de vida que defende. Façamos o que fizermos acabamos sempre por morrer, por isso mais vale ficarmos quietinhos para não sujar a roupa do que andar a saltar por aí e esfolar os joelhos.
Quer se acredite que por vontade de uma entidade superior, por puro acaso, ou porque quisemos, a verdade é que estamos aqui. Estamos aqui e temos de passar por uma série de chatices que nunca pedimos a ninguém (?), logo, quando nos é dado o poder de escolha, é preferível um cenário calmo, sem grandes complicações.
Que tédio.
Nos últimos tempos tenho-me cruzado com imensos casos – directa ou indirectamente – de pessoas que escolhem a passividade como forma de protecção. Para que é que vou dar um salto se há o risco de me magoar? Por isso mesmo.
O que são as cicatrizes e as rugas senão sinais e marcas de que se viveu? “Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova”… As queimaduras doem, as feridas doem mas acabam por saber bem quando fomos nós que as escolhemos. Porque, naquela altura, só ficaríamos verdadeiramente felizes se déssemos um salto. E moveu-nos.
O meu pai está sempre a contar que, numa aula de Química Fisiológica, o professor, Celestino da Costa, disse que a vida é uma reacção permanente entre ácidos e base à procura do equilíbrio químico que, quando se atinge, representa a morte. Percebem?
Estamos aqui. Saltem.
Nem sempre se cai.
Não tem muito a ver com o post (ou será que tem), mas, enquanto o lia, lembrei-me de algo que o Oscar Wilde diz no “De Profundis” e que é mais ou menos assim: “Se a vida é um problema para mim, eu não vou ser menos que um problema para a vida.” I think it makes sense considering the context. Jinhos
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Mais vale um pé torcido e um nariz esfolado do que uma vida sentada no canto do sofá. Acreditem…
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point taken. enjoy your jump.
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Para que saibam, a Marta, em bébé, tropeçava na relva e estava constantemente a cair. Das primeiras vezes, eu lá acorria pressuroso para lhe dar mimos. Depois lembrei-me de que eu fora uma criança superprotegida e que detestei essa protecção. Mudei de téctica, Quando ela caia, ficava quieto e, antes que ela chorasse, dizia em tom militar: Marta levanta-te. E só depois de ela se levantar é que lhe pegava.Dez anos depois, a Marta estava a fazer pontas no ballet.Artur
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elles viennentautres et pareillesavec chacune c’est autre et c’est pareilavec chacune l’absence d’amour est autreavec chacune l’absence d’amour est pareillemr beckett (1937)mergulha Lídia, afoga-te no fundo do rio.
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